quinta-feira, 24 de abril de 2008

Série Recordar é Viver!!!


Coluna escrita por mim no jornal O Diário em 9 de setembro de 2005. Trata sobre Educação Musical nas escolas.

Dia desses lembrava-me das tardes que passava na casa de minha saudosa avó Zerlina Braga (mais conhecida como Dona Ziza), enquanto meus pais trabalhavam. Na cozinha sempre tinha café com leite, tapioca, bolo, biscoitos, hummmm...Na varanda uma confortável cadeira de balanço. Na sala, um velho piano, que vez ou outra era dedilhado por ela, um objeto de adoração. Apesar da mobilidade não ser a mesma de quando mais jovem, era com o coração que vovó tocava seu instrumento predileto.

Ciosa professora de música, Dona Ziza era uma dedicada na arte de ensinar aos alunos do Colégio Estadual Visconde do Rio Branco, na época Grupo Escolar Visconde do Rio Branco. Fazia questão de ensaiar verso a verso o Hino Nacional, Hino à Bandeira, Hino da Proclamação da República e Hino da Independência, bem como cantos folclóricos e outras melodias. Organizava grupos orfeônicos muito apreciados. Era bastante exigente nos métodos de ensino, porém bastante respeitada pelos alunos. Para ela, a música era uma forma de disciplinar e incentivar o patriotismo.

Mas muita coisa mudou desde a época em que vovó lecionava nos colégios públicos (décadas de 50, 60 e 70) até os dias atuais. A partir de 1971, o professor de Educação Artística ficou responsável por uma prática pedagógica polivalente, que incluía a educação musical. A educação musical tornou-se, então, privilégio, pois a maioria das escolas brasileiras foi com o tempo, abolindo o ensino de música dos currículos escolares devido a fatores como a não obrigatoriedade na grade curricular e a falta de profissionais da área. Atualmente, só através de alguns poucos abnegados professores, a música é ensinada em sala de aula. De modo geral, o ensino de música nas escolas parece estar desaparecendo gradualmente.

Com boas recordações, lembro-me que em meados da década de 80, ainda pude ter boas aulas de educação musical no antigo IEPAM (hoje ISEPAM), colégio onde estudei por vários anos e onde aprendi a cantar os hinos oficiais, entre outras atividades que envolviam conhecimentos musicais diversos, que muito me auxiliaram ao longo de minha vida. Faziam parte do seleto grupo de professores de reconhecido talento do IEPAM nomes como: Vania Ventura Barreto, Vicente Marins Rangel Junior, Vilma Rangel Braga, Nelly Albernaz, Élvia Miranda, Electra Salgado, Jocinéia Ferreira, entre outros.

A música nas escolas teve no grande maestro Heitor Villa-Lobos o seu porta-voz maior. Aluna do autor das Bachianas Brasileiras, que além de músico, era educador, vovó captou bastante seus ensinamentos e sempre se recordava com saudade do mestre. Vale ressaltar que Villa-Lobos formulou um projeto de educação musical e o apresentou a diversos políticos da época, em busca de apoio.

Com o golpe de 1930, Getúlio Vargas toma o poder e propõe ao maestro viajar pelo Brasil inteiro, dando aulas e cursos especializados. Perspicaz, Vargas tinha o objetivo de reforçar o clima de exacerbado nacionalismo vivido no país pós-30. A partir de então, o canto orfeônico sempre foi muito presente nas escolas.

Villa-Lobos aproveitou o momento político e tornou o canto orfeônico um meio eficaz de educação em massa. É dele a célebre citação: “O canto orfeônico integra o indivíduo dentro da herança social da Pátria; é a solução lógica para o problema da educação musical nas escolas, não somente na formação da consciência musical, mas também como um fator de orgulho cívico e disciplina social”. Através da educação musical nas escolas é possível quebrar barreiras sociais, assim como também é possível formá-las. Portanto, é necessária uma disseminação musical para que a música se torne além de um fator individualista, um fator agregador de valores. E por que não recomeçar nas grades escolares o ensino específico da música? Se reconhecemos a importância da atividade musical na vida do indivíduo, porque não dar a ela o valor merecido ao lado de disciplinas como: matemática, português, literatura, entre outras? Vale lembrar que hoje em dia a musicoterapia é moda nos consultórios. E se a música pode curar doenças, o que não poderá fazer de positivo na formação no caráter de uma criança? Sem dúvida, a música já faz parte da vida do ser humano antes mesmo dele aprender a falar e a escrever. Desde seu primeiro choro, o balbuciar, a canção de ninar... Enfim o homem é um ser musical por excelência. Atenção governantes e políticos que se dizem preocupados com a educação: por favor dêem ao ensino da música o valor e o lugar que ele merece. Vovó Ziza, lá do céu, agradece!!!

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